Se identificar uma informação falsa que chega no seu Whatsapp demanda certo esforço de checagem, uma mínima corrida ao Google, vá lá… Imagina numa região remota, com zero internet e pouco acesso à informação de qualidade? Um solo fértil para crescer a desinformação e espalhá-la rapidamente.
O Intervozes, por meio do Grupo de Trabalho (GT) de Combate à Desinformação e Discurso de Ódio na Amazônia Legal, e com apoio de outras 8 instituições, lançou durante os Diálogos Amazônicos semana passada, em Belém (PA), um relatório sobre o mapeamento de disseminadores de conteúdos enganosos na região Amazônica.
Foram mais de 200 páginas levantadas, em que são perfilados três grandes segmentos, a partir de suas recorrências e aproximações: organizações e ativistas de direita, figuras públicas de representação política e canais ou empresas jornalísticas. Pelo estudo, fica possível perceber onde começa onda de boataria, negacionismo e discursos de ódio, ativos principalmente durante as eleições – mas não só.
Tal onda de desinformação ganha terreno, sobretudo, onde a fonte local de notícias é inexistente. E como já é sabido, a cidadania brota em solo cultivado por informação. Sem consciência dos seus direitos e responsabilidades, os cidadãos ficam à mercê de manipulações por parte de grupos partidários que moldam opiniões conforme suas conveniências.
O Atlas de Notícias vem acompanhando desde 2017 os chamados ‘desertos de notícias’, ou seja, municípios brasileiros onde não há sequer um mísero blog a reportar informações locais de interesse público. No último levantamento, uma boa notícia: 30% de redução nos ‘desertos de notícias’ da Região Norte, onde está sua maior incidência. O Le Monde Diplomatique trouxe uma ótima matéria sobre o tema, abordando técnica e praticamente os vieses complexos de desertos de notícias existentes no Brasil.
O que causa espanto no levantamento é que era de se esperar que os estados mais afetados por tal mal fossem os mais isolados e com menos infraestrutura. Mas o que dizer de São Paulo, em que 331 dos 645 municípios estão ‘no escuro’? Este apagão de informações que atinge 51% dos municípios paulistas também afeta 45% das cidades fluminenses. E se no eixo Rio-SP há esse vazio, o que esperar dos demais estados, não?
Talvez o que mais assuste seja saber que, mesmo com acesso à informação, há ainda quem prefira viver no escuro. Ignorando notícias, sejam elas sobre vacinas, mudanças climáticas, mapa da fome, ou mesmo desvio de joias e Rolex.
O diabo mora mesmo nos detalhes.