Ao longo desta semana, o Tesouro Nacional realizará um road show para apresentar a investidores internacionais o Arcabouço Brasileiro para Títulos Soberanos Sustentáveis. Os encontros serão decisivos para a expectativa do governo de fazer a primeira emissão ainda este ano. O valor exato do montante a ser captado não foi divulgado, mas o secretário do Tesouro, Rogério Ceron, disse ao Valor Econômico esperar uma cifra superior a US$ 1 bilhão.
O documento foi lançado na semana passada, e contém as regras que o país deve cumprir para a emissão de títulos cujos recursos captados deverão financiar despesas de impacto social ou ambiental positivo. O arcabouço prevê a emissão de green, social ou sustainability bonds, sendo este último destinado à combinação de despesas sociais e ambientais.
A julgar pelas experiências de países vizinhos, a futura emissão brasileira de títulos soberanos ESG encontra-se em um contexto favorável. No ano passado, o Chile fez a sua primeira emissão de sustainability-linked bonds (SLBs), com a captação de US$ 2 bilhões e vencimento em 20 anos.
Com a operação, o governo chileno se tornou o primeiro do mundo a vincular a uma emissão de títulos suas metas de redução de emissões, assumidas no Acordo de Paris, que busca controlar o aquecimento global em 1,5ºC. Esse também foi o objetivo do Uruguai ao fazer, também no ano passado, a sua primeira emissão de sustainability-linked bonds.
Com base em informações do índice Bloomberg MSCI, apenas no mercado de green bonds a fatia global dos títulos soberanos saltou de 7% para 20%, alcançando US$ 197 bilhões este ano.
O lado cheio do copo são os títulos soberanos sustentáveis que começam a emergir como ferramenta promissora para o enfrentamento do triplo desafio de combinar dívida pública, choques climáticos e degradação da natureza. Se esses títulos vão conseguir demonstrar a materialidade de suas metas, isso é assunto para um outro editorial.
O lado vazio do copo é que apenas instrumentos financeiros que atendem à lógica do grande capital não serão suficientes para resolver os dilemas em torno do financiamento climático. Em artigo publicado no Globo como resultado de parceria com a Alter Conteúdo, Suzana Kahn, professora titular da COPPE/UFRJ, lembra que o tema foi um dos principais pontos de divergência durante a reunião preparatória para a COP28, em Bonn, na Alemanha.
De um lado, países ricos cobram mais ambição das metas climáticas assumidas pelos países em desenvolvimento. Do outro lado, a ambição é condicionada ao cumprimento de compromissos já assumidos por nações desenvolvidas em destinar recursos para o financiamento de ações de mitigação e adaptação em países pobres.
O que está em jogo, não custa lembrar, são perdas irreversíveis de natureza econômica, material e, sobretudo, humana.