“Ondas maciças de fome ainda atingem algumas regiões de tempos em tempos, mas são exceções, quase sempre provocadas por políticas humanas e não por catástrofes naturais. Há apenas fomes políticas.” (Yuval Noah Harari, 2015).
Na terça-feira (18/7) a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), coordenada pelo deputado Pedro Lupion (PP/PR), enviou vídeo para sua lista de transmissão no Whatsapp com o título A verdade que não te contaram sobre o agro brasileiro. A assinatura da peça de marketing faz lembrar o pensamento de Harari: “FPA – Alimentando o Brasil e o mundo com tecnologia”. Obriga a perguntar: você tem fome de quê? Qual a sua fome política?
A mensagem que encerra o semestre de trabalho ruralista foi criada praticamente como uma ferramenta de prevenção e gestão de crise, no ritmo de texto de uma cartilha de mitos e verdades. Com locução profissional e lindas imagens da flora e da fauna brasileiras, a bancada ruralista informou que o Brasil tem um modelo de produção sustentável, que inclui o Plano Nacional de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura. “O Brasil é o terceiro maior exportador de alimentos do mundo, mantém 66,3% de vegetação nativa protegida, sendo que mais de 25,6% está em propriedades rurais.”
Com a novela “Terra e Paixão” no ar na TV Globo, em horário nobre e ainda por cima batendo recordes de audiência com a atuação de Tony Ramos vivendo um fazendeiro das antigas, a FPA tem tentado reverter o mal-estar, trazendo as narrativas de um agro tecnológico, moderno, humano e sustentável. Usa para isso as próprias redes sociais e, quando necessário, faz seu lobby para continuar garantindo que o agro permaneça pop e tech na televisão.
Já a Frente Parlamentar Ambientalista, coordenada pelo petista Nilto Tatto (SP), tem usado outras estratégias em sua comunicação. Usa o debate como ferramenta de convencimento e atua na produção de conteúdos por meio de webinars e podcasts que reúnem decisores públicos e nomes fortes de ONGs e outras instituições dedicadas à defesa do meio ambiente, como a SOS Mata Atlântica.
Não há queda de braço entre ambientalistas e ruralistas nesses espaços. Não há opositores nem detratores claros nas peças produzidas de um lado ou de outro. Já se foi o tempo em que a bancada ambientalista tinha fôlego para desconstruir de forma combativa os discursos da ruralista. Muito pelo contrário: as duas frentes se misturam, porque muitos parlamentares são membros e participam das duas bancadas ao mesmo tempo.
Como Jano, o deus romano, as duas frentes formam um ser que tem duas cabeças, uma voltada para frente e a outra para trás. A harmonia desta coexistência, entretanto, não deve durar muito tempo. Afinal, Jano é o deus dos inícios, das decisões e das escolhas. E a volta de recesso, em 2 de agosto, promete. Em breve, os parlamentares serão cobrados pelas escolhas e pelas fomes políticas que provocarem. A ver.