O governo planeja reduzir em 10% a diferença da renda média do trabalho entre homens e mulheres e chegar a 45,2% de formalização das mulheres no mercado de trabalho. É o que diz o Relatório Agenda Transversal de Mulheres, que reúne os compromissos voltados para as mulheres no Plano Plurianual 2024-2027.
Entre os objetivos previstos estão também reduzir em 16% as mortes violentas de mulheres dentro de casa e em 55% a mortalidade materna. Assim como a construção de unidades de atendimento às vítimas de violência.
Sem dúvida, a iniciativa é fundamental, focada na trágica realidade das mulheres brasileiras, principalmente das negras e de baixa renda, numa sociedade machista e preconceituosa. O plano, porém, também é exasperador, pois desnuda o enorme atraso do nosso país, moldado pela desigualdade.
Para ser factível, a meta de renda não visa a equiparação salarial entre homens e mulheres, mas sim a diminuição da diferença para 10%. Para ser realista, não define zerar as mortes violentas de mulheres, mas, sim, reduzi-las em 16%.
É caminhando que se faz o caminho, diz o poeta. Sabemos disso, mas queremos passos largos nessa maratona. Ela é urgente.
Gênero e raça na Pnad
Prova disso são os dados mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do IBGE, relativos ao quarto trimestre de 2023. Eles permitem avaliar o tamanho da discriminação por gênero e por raça.
O Brasil conta com 90,6 milhões de mulheres com 14 anos ou mais, das quais 47,8 milhões fazem parte da força de trabalho. Dessas, 4,4 milhões estão desocupadas, sendo 2,9 milhões delas mulheres negras. As desalentadas (que desanimaram de procurar emprego) somam 1,9 milhão, sendo 1,4 milhão delas negras. São também as negras que lideram as estimativas de taxa de informalidade, com 41,9% delas sem direitos trabalhistas ou proteção social.
Os dados, cruéis, refletem-se também no rendimento e no nível de escolaridade e ampliam o enorme fosso entre homes e mulheres, negros e não-negros.
A Pnad mostra que 39,9% das mulheres ocupadas recebem até um salário mínimo. Em cargos de direção e gerência, as mulheres ganham em média 27% menos que os homens. O rendimento médio mensal dos homens não-negros foi de R$ 4.228 – acima dos R$ 3.242 das mulheres não-negras. No caso dos negros, o valor médio cai para R$ 2.467. Para as negras, foi de R$ 1.957.
Em um outro recorte, a pesquisa mostra que os homens com ensino superior ganharam em média R$ 7.283 por mês, enquanto as mulheres receberam R$ 4.701. Para as mulheres negras, o montante mensal não passou de R$ 3.721.
Mulheres petroleiras e a inequidade
As diferenças de gênero são comprovadas pelo perfil de emprego da maior empresa do Brasil, a Petrobras. A estatal tem 45,2 mil empregados próprios. E as mulheres representam 17% do total da força de trabalho da companhia, segundo dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), seção Federação Única dos Petroleiros (FUP).
A grande maioria das funções exercidas pelas mulheres, mesmo executando a mesma atividade que os homens, tem rendimento inferior. As trabalhadoras de nível médio recebem, em média, 78% da remuneração do homem; as de nível superior ganham, em média, 93% da remuneração masculina.
O problema é antigo. Com base em uma série histórica, o Dieese observa que as trabalhadoras do setor de petróleo e gás natural sempre receberam remuneração menor que os homens.
Comparada a outras grandes petroleiras, a Petrobras é a que apresenta menor participação proporcional de mulheres no total da força de trabalho. Em relação à ocupação de cargos de chefia, novamente o efetivo feminino da estatal tem a menor presença – 19% – em comparação com petroleiras internacionais.
Uma das mais importantes empresas brasileiras, a Petrobras nasceu em 1953 da luta pelo direito do Brasil a explorar seu petróleo. Ao longo desses 70 anos, as mulheres petroleiras continuam travando grandes embates. Assim como grande parte da força de trabalho feminina, em todos os setores da economia.
Não sabemos até quando teremos de lutar. Mas garantimos que lutaremos até que a equidade de gênero e de raça não seja uma reivindicação, mas uma regra.
* Durante todo o mês de março, os editoriais da Estratégia ESG serão escritos exclusivamente por mulheres que compõem a equipe da Alter Conteúdo e convidadas. Mais do que uma homenagem ao Dia Internacional da Mulher, nosso objetivo é trazer reflexões variadas sobre a construção do feminino e suas implicações no dia a dia das mulheres.