A tragédia sem precedentes no Rio Grande do Sul impõe, mais uma vez, o alerta máximo para a necessidade de mudanças profundas no modelo de desenvolvimento do país. Que, equivocadamente, prioriza investimentos em recuperação, em detrimento de recursos para prevenção.
Os fenômenos climáticos exigem planejamento e implementação de políticas preventivas. Nesse contexto, é necessário aprofundar o debate em torno da transição energética justa, com avanços na agenda das relações entre trabalho e meio ambiente.
Levantamentos do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), com apoio do Instituto Clima e Sociedade (iCS), mostram que os empregos gerados até então pelos setores verdes – postos de trabalho que contribuem para a redução das emissões de carbono e para melhorar e preservar a qualidade ambiental – cresceram menos do que aqueles de setores tradicionais. Além disso, tiveram salários mais baixos e menores benefícios sociais. Ou seja, são empregos mais precarizados.
Os empregos gerados em setores verdes representam apenas 6,7% do total de empregos no país. Além de manterem uma remuneração média inferior à do total, tiveram queda de 11,2% entre 2018 e 2020. Em 2020, a remuneração média dos empregos formais no Brasil atingia R$ 3.004, enquanto nos setores verdes era de R$ 2.728.
Para a agenda trabalho e meio ambiente avançar é necessário promover mudanças estruturais no mercado de trabalho brasileiro, inclusive nos empregos verdes. E evitar que a revolução tecnológica, com maior digitalização da produção, venha a excluir os trabalhadores desse processo.
O desafio passa pela capacitação profissional, com articulação entre governo federal, entidades privadas, representação de trabalhadores e sistema educacional para reformular a agenda de formação de mão de obra e acompanhar as mudanças no mercado de trabalho em meio à transição energética.
A Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês) estima que a demanda global por combustíveis sustentáveis vai crescer três vezes até 2030, atingindo cerca de 6 milhões de barris de óleo equivalente por dia. E o Brasil tem papel fundamental na expansão dessa oferta e caminha nessa direção. Cerca de US$ 30 bilhões em projetos de produção de hidrogênio renovável foram anunciados no país, segundo dados compilados pelo Ministério de Minas e Energia (MME). O Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) prevê R$ 1,7 trilhão em investimentos em infraestrutura e transição ecológica, e boa parte disso deverá ser financiada pelo BNDES.
Esse processo, contudo, tem que ser conduzido com democracia e participação social. Somente assim a transição energética será justa, inclusiva e vai contribuir não apenas para a descarbonização da economia global, mas para a redução das desigualdades sociais.