Em meio às queimadas que se alastram pelo país, devastando a nossa biodiversidade e a saúde de muitos brasileiros, apenas uma reflexão é possível: o que nos sufoca?
Para além do ar poluído e carregado de fumaça, são inúmeras as possibilidades de respostas para essa pergunta, principalmente se o recorte levar para um teor pessoal. Mas, na esfera do coletivo, algumas perspectivas podem, e até devem, ser abordadas e questionadas.
Estamos imersos e sufocados por uma policrise, conceito que se caracteriza pelo entrelaçamento de problemáticas de origens diversas, o que dificulta a definição de uma só resposta. A começar pela emergência climática que, há muito, sinaliza que precisa da devida atenção e prevenção.
O recente anúncio do governo federal de um crédito extraordinário para o combate aos incêndios florestais trouxe à tona mais um debate. Alguns especialistas questionam: diante dos mais de 150 mil focos de incêndio, que já sufocam a tantos e representam um aumento de 100% em relação ao ano passado, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o que ainda falta para ser declarado um estado de emergência climática nacional? O mundo inteiro enfrenta uma crise climática preocupante e devastadora. Mas como não se preocupar ainda mais quando do quintal de casa dá para ver e sentir os sinais de fogo? Ou quando passamos a viver em dias nublados que parecem não ter fim?
A proximidade do dia da votação para as eleições municipais reacende outra reflexão: quem nós queremos, e precisamos, que ocupe os poderes legislativos e executivos das 5.568 cidades do país? Eleger representantes que vão lutar por nossos direitos é, sim, mais um sufoco que precisaremos enfrentar esse ano. E dos grandes. Principalmente quando temos na telinha das urnas a foto e o número de candidatos inescrupulosos, que ditam campanhas políticas imorais, e buscam por mandatos igualmente sujos.
Como conscientizar os mais de 150 milhões de eleitores brasileiros sobre a importância dos seus votos para a construção de uma sociedade mais justa? Muitos nem sabem, ou pouco sabem, sobre as responsabilidades que cabem a prefeitos e vereadores. A construção e implementação da política de habitação de uma cidade, por exemplo, é competência constitucional dos municípios, como bem pontuou a matéria da Agência Brasil sobre o tema. E ter acesso a direitos básicos, para os que vivem em vulnerabilidade social, em um sufoco que parece não ter fim, é questão de sobrevivência.
Do meio ambiente sendo destruído pelo agronegócio, às questões sociais, ainda negligenciadas por tantos governos (os que estão no poder e os que querem chegar), passando por situações que causam revolta e indignação, como a pandemia das apostas esportivas e de cassinos online, que se espalham pelo país viciando pessoas e levando muitos à falência e à dependência psicológica. Muitas são as causas diárias dos sufocos que enfrentamos. Até quando vamos permitir que nos façam viver respirando um ar que não é respirável?
Na verdade, sabemos bem os motivos que nos fazem passar por tanto sufoco. São muitos, são cansativos, e às vezes parece que são intermináveis. Vivemos sempre à beira da exaustão, esperando chegar o final de semana para tentar respirar sem o desespero das notícias pesadas, do estresse do trabalho, do medo do amanhã devastado pelo fogo. Mas não existe folga. Enquanto houver tanto sufoco, precisa haver luta na mesma medida. Até apagar o último foco de incêndio. Até que todos tenham garantidos os seus direitos básicos. Até que a gente consiga respirar fundo sem se engasgar.