‘Passei metade da vida derrubando árvores e a outra metade plantando’. A frase matuta de meu pai, com 93 anos de idade, mimetiza o agronegócio brasileiro. Dos anos 60, quando o nosso Cerrado era só mato, até os dias de hoje, como um dos maiores produtores de grãos e proteína animal do planeta, a natureza e o mercado se impuseram.
Não há mais como o setor fugir das pautas ESG. Seja pelos extremos climáticos, que trazem prejuízos econômicos, sociais e ambientais gigantescos, seja pela cobrança dos mercados consumidores. Na sua maioria, o produtor rural já entendeu a necessidade de proteger o seu solo e a sua água para produzir alimentos em escala e qualidade. Também boa parte é cumpridora do novo Código Florestal. Contudo, a maioria não é o todo, bem como somente o pilar ambiental não traz sustentabilidade nos meios de produção. Fica capenga. É preciso ir além.
No ‘além’ é que reside o problema, porque depende de toda a cadeia produtiva, que até agora não conseguiu equacionar custos e benefícios da agenda ESG. São movimentos isolados, são relatórios de sustentabilidade embelezados, mas, quando convidados a discutir profundamente o futuro dos meios de produção, considerando transição energética e descarbonização da economia como primeiros exemplos, o agronegócio ainda tem dificuldade de entender qual é o seu real papel nessa transformação.
As discussões no Congresso Nacional envolvendo mercado de carbono, demarcações de terras indígenas e desenvolvimento de novas tecnologias na transição energética são feitas ao sabor do maniqueísmo fácil e rápido da vitimização e criminalização de um lado e do outro e vice-versa. Recorrendo ao chavão verdadeiro de que ‘o Congresso é o espelho da sociedade’, acabamos nos tornando todos reféns do impasse falsamente ideológico.
Toda e qualquer transformação passa pela vontade da sociedade de se envolver na mudança. Nos fóruns institucionais de discussão, seja ele o Congresso Nacional ou a COP, o agronegócio não deve ser somente ativo, mas corresponsável pelos seus avanços e desastres.
Não dá para fugir dos temas usando o maniqueísmo como esconderijo. A persistir, plantar árvores será só um paliativo.
*Euzi Dognani é jornalista, produtora rural, especialista em relações governamentais e agronegócios e colaboradora da Alter Conteúdo