Não era porque estava chegando ao mar. Eram o verde intenso, as flores, o clima úmido com água correndo pelas pedras, árvores imensas e uma sensação primitiva e cinematográfica que me encantavam. Chegar à Serra do Mar, rumo ao litoral de São Paulo, tinha esta mágica. Um portal de felicidade que parecia intocado aos olhos de uma criança.

Hoje, este fragmento de mata ainda está lá e segue recebendo com frescor todos os tipos de turista. Mas perdeu força, corpo e permanece cobiçado e violado em sua plenitude.

Uma reportagem da Folha nesta semana mostrou o crescente desmate em encraves da Mata Atlântica. Por encraves entendem-se as ‘ilhas’ de vegetação típicas do bioma dentro de outros, como o Cerrado, a Caatinga e o Pantanal. Os dados, divulgados pela Fundação SOS Mata Atlântica, se baseiam em dois levantamentos: o Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica, realizado em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e o Sistema de Alertas de Desmatamento (SAD), da rede colaborativa MapBiomas.

Uma comparação entre os dois levantamentos aponta que o desmatamento na Mata Atlântica caiu de 2022 para 2023, mas isso não aconteceu nos pequenos espaços deste bioma espalhados pelo nosso país. Expansão agrícola, urbana e mineração são as principais causas.

Nas viagens ao litoral, a mata sempre me pareceu forte, apesar dos caminhos abertos por túneis e dos movimentos incessantes dos carros.

Presente em 17 estados brasileiros, a Mata Atlântica abrange 15% do território nacional e vai do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul. Convive com 72% da população brasileira e concentra 80% do PIB nacional. Mas vem ‘perdendo o jogo’ há 523 anos. Hoje, sobram apenas 24% da floresta que existia.

Já mocinha, nas viagens ao litoral, lembro com orgulho de um adesivo fixado no vidro traseiro do carro de meu pai: ‘SOS Mata Atlântica’.

Era o início do fortalecimento dos movimentos ambientais, que cresciam junto com a abertura política no Brasil. Entre várias conquistas, a organização ajudou a frear o desmatamento desta reserva com uma lei específica para o bioma. Mas como quase sempre acontece no Brasil, esta lei recebe contestações de governos estaduais e municipais, e a mata segue perdendo batalhas.

Os movimentos ambientais no Brasil aproveitaram-se daquela nova ‘janela de oportunidades’ que se abria no país. Discutiram, e ainda hoje discutem, o melhor caminho para vencer esta guerra que objetiva manter a mata viva: política, movimento apartidário, pressão social organizada, consciência cidadã.

Quais são as políticas públicas que podem trazer solução para este convívio? Na Mata Atlântica, ao longe, a beleza vem de um conjunto verde volumoso. De perto, imaginamos o motivo desta força: centenárias árvores servem de guia para novas gerações, e a renovação há de encontrar caminhos, cada vez mais eficientes, para manter a mata em pé e longe de um grito de socorro.

Por: Flávia Chiarello