A definição de sustentabilidade não permite muita interpretação: é o desenvolvimento sem esgotar recursos para o futuro. Como gerir o uso de água (e toda a sua cadeia de consumo, até a devolução para os corpos hídricos) para que possamos manter a atividade humana nessa geração e para aqueles que virão? Ou como ampliar a produção de alimentos para que sejamos capazes de alimentar 8,5 bilhões de pessoas sem esgotar a terra para que seja possível à próxima geração produzir comida?
Nesse cenário, de pensar no longo prazo, uma pergunta passa à margem do debate e fica restrita àqueles que lutam pelo direito à terra: em 2100, quem terá acesso a ela?
De acordo com dados do Incra, quase 57% da área agricultável do país pertence a 3% das propriedades rurais. E muitas vezes essas aquisições são marcadas por grilagem e processos ilegais constantemente denunciados pelos movimentos de reforma agrária.
Assim, enquanto um território equivalente aos estados de São Paulo e Paraná está concentrada na mão dos 300 maiores produtores rurais, mais de 4,8 milhões de famílias aguardam um pedaço de chão para produzir comida.
Os latifúndios ainda revelam outras faces da desigualdade: a produção de grãos para alimentar gado, com custos proibitivos para grande maioria do país, e o uso de agrotóxicos, que contaminam solo, água, ar e pessoas. A insustentabilidade do sistema, com uma demanda cada vez maior por terra para aumentar a produção na contramão de técnicas de recuperação de pastagem ou saberes tradicionais de cultivo, prejudica quem não é detentor da terra e ameaça a sobrevivência de milhões de brasileiros que vivem em situação de insegurança alimentar.
Nas cidades, a concentração fundiária também é uma ameaça para que as futuras gerações tenham um teto sob o qual viver. Atualmente, o déficit habitacional brasileiro alcança pelo menos 6,2 milhões de residências, segundo a Fundação João Pinheiro.
Enquanto isso, os dados patinam em revelar nas mãos de quem estão concentrados os imóveis no Brasil. A especulação imobiliária e a existência de terrenos e edificações bem localizados que não cumprem uma função social – resultado da concentração de muitos imóveis nas mãos de poucos – é outra ameaça aos direitos das futuras gerações.
Com o crescimento populacional e a concentração de renda histórica que só se aprofunda, cada vez mais será inviável conseguir pagar aluguel de uma moradia digna. Este é o principal elemento do déficit habitacional brasileiro.
A concentração de terra tem gênero e cor. Ela é centrada em homens brancos, excluindo a diversidade étnica, cultural e de gênero, aprofundando ainda mais a disparidade de renda entre um homem branco e uma mulher negra.
Diante desse cenário, a transformação das cidades – e do campo – em territórios inclusivos, igualitários e justos socialmente é um dos desafios – e caminhos – apontados pela ONU na Agenda 2030, com metas para construirmos um mundo mais sustentável.