As eleições municipais já estão batendo na porta e nos convidando para, mais uma vez, indicarmos representantes para prefeituras e câmaras municipais. Onde estão as pessoas negras neste cenário? Em quem nós queremos votar? Até quando sustentaremos o “por falta de opção, vou no menos ruim”? É hora de aquilombar esse direito arduamente conquistado, o do voto, e ir em busca da transformação política e social que tanto almejamos.
Ter lugar de fala e estar em espaços de tomada de decisão é fundamental para a construção de políticas públicas que combatam a ferida aberta do racismo e atendam as demandas de uma população que continua a ser explorada e marginalizada. E o motivo, ainda que precise ser dito constantemente, é óbvio: quem pode pensar melhor em nós, e por nós, que não seja um semelhante nosso? Um levantamento do Núcleo de Estudos Raciais do Insper conseguiu mensurar e responder a esta pergunta: líderes negros tendem a propor três vezes mais leis e políticas públicas dedicadas à inclusão do que os não negros.
Recentemente, a Coalizão Negra por Direitos, coletivo que reúne mais de 350 entidades do movimento negro brasileiro, lançou o Manifesto do Quilombo nos Parlamentos para as Eleições 2024, com o objetivo de aumentar a quantidade de candidaturas e, consequentemente, da presença de pessoas pardas e pretas nos parlamentos. O documento, que reúne recomendações aos partidos políticos, ao sistema de Justiça brasileiro e às organizações da sociedade civil, é uma iniciativa criada para fortalecer a importância da representatividade racial dentro dos parlamentos.
Uma pesquisa recente publicada pelo Datafolha apontou que a maioria dos eleitores entrevistados em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Recife acha que faltam vereadores negros e mulheres nas Câmaras municipais das suas cidades. E, nesse caso, o que se vê, é o que realmente é: em Belo Horizonte e no Rio de Janeiro a presença negra nesses espaços não chega a 40% em relação à população de pretos e pardos dos estados, em São Paulo apenas 20% dos vereadores em exercício se declaram pretos ou pardos, e em Pernambuco esse índice é de 28%.
Na câmara dos deputados, a criação da bancada negra, que representa os 122 deputados e deputadas federais que se autodeclararam pretos ou pardos na última eleição, representou um importante passo para amplificar nossas vozes. Uma conquista resultante de anos de luta, dentro e fora dos parlamentos, e que só foi alcançada em novembro de 2023. Mas, ainda assim, a bancada negra é minoria e não chega a 30% do parlamento, e a construção de um projeto para a população brasileira, livre do racismo e de todas as formas de discriminação, precisa passar pela busca da igualdade racial, também, em lugares de poder, visibilidade e representatividade. A conclusão é inequívoca: precisamos de mais, e muitos, de nós nesses espaços. É, sim, uma questão de sobrevivência e de viver, enfim, com dignidade. Mas é, sobretudo, o caminho para uma mudança urgente e necessária que irá beneficiar toda a população brasileira.