Dois estudos publicados no mês de julho nos trouxeram visões ambíguas sobre os impactos ambientais causados pelo aceleramento da economia digital.
De um lado, o relatório Era Eco-Digital, do Capgemini Research Institute em colaboração com o Digital Value Lab de Harvard, defende que estamos em uma transição dual na economia, na qual a digitalização e a sustentabilidade caminham lado a lado. A conclusão do estudo é que a tecnologia gera redução das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) e melhoria em eficiência energética.
Do outro, o Relatório de Economia Digital 2024 da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) pondera que, embora a digitalização impulsione o crescimento econômico global e traga oportunidades de redução da pegada de carbono, suas repercussões ambientais são cada vez mais graves.
A visão otimista sobre a era “eco-digital” se concentra no argumento de que as tecnologias digitais têm demonstrado um potencial significativo de reduzir a pegada de carbono do setor produtivo. Segundo o relatório, empresas que implementaram soluções digitais conseguiram reduzir seu consumo de energia em 24% e suas emissões de GEE em 21% nos últimos cinco anos.
Já a perspectiva da ONU é bem mais ampla. A pesquisa mostra que os impactos gerados pelo crescimento do setor gera uma demanda exacerbada por eletricidade, resultando em um aumento considerável de emissões de GEE. Além disso, há a elevada exploração de minerais críticos, o alto consumo de água e a produção intensiva de resíduos.
Segundo o relatório da UNCTAD, as remessas anuais de smartphones mais que dobraram desde 2010, atingindo 1,2 bilhão em 2023, e os dispositivos de Internet das Coisas (IoT) devem aumentar 2,5 vezes de 2023 para 39 bilhões até 2029. Pelo fato da economia digital ser intensiva no uso de recursos, esse crescimento está causando um impacto ambiental significativo. Um computador de dois quilos requer 800 quilos de matérias-primas e um smartphone, cerca de 70 quilos. A fase de produção é a mais impactante para o clima, gerando cerca de 80% das emissões.
Já a crescente demanda por transmissão, processamento e armazenamento de dados para tecnologias como blockchain, inteligência artificial (IA), redes móveis de quinta geração (5G) e internet das coisas (IoT) está aumentando consideravelmente as emissões. Em 2020, o setor de TIC emitiu entre 0,69 e 1,6 gigatoneladas de equivalentes de CO2, correspondendo a 1,5% a 3,2% das emissões globais de GEE.
Outro ponto de atenção é o fato de que o lixo digital está crescendo mais rápido do que as taxas de coleta. Entre 2010 e 2022, atingiu 10,5 milhões de toneladas. O descarte inadequado resulta em poluição e riscos preocupantes à saúde e ao meio ambiente. Além disso, a UNCTAD alerta que os países em desenvolvimento arcam com o peso dos custos ambientais da digitalização enquanto colhem menos benefícios.
A ambiguidade de perspectivas dos relatórios mostra que, para haver uma “transição eco-digital,” é necessária uma abordagem mais equilibrada. A integração da produção e do consumo de tecnologias digitais com práticas sustentáveis, como a circularidade, o uso de fontes de energia renovável, o aumento da eficiência energética e o consumo consciente de dispositivos eletrônicos, precisa aumentar.
Nessa conjuntura, a colaboração entre indústrias e a inovação contínua serão fundamentais para acelerar as melhorias necessárias e garantir a redução da pegada ambiental do setor.