Em um mundo onde as mensagens são transmitidas em milésimos de segundo e essa velocidade parece ditar o ritmo das nossas vidas, a pausa para uma conversa ganha peso de ouro. Mais do que isso, há algo realmente encantador e profundamente humano na arte da conversa. Em especial, na capacidade da gente mais simples do Brasil, que sabe conversar como poucos.
Ao contrário do frenesi atual, há quem saiba valorizar o tempo dedicado e explorar a estratégia singela, sutil e extremamente eficaz para isso: a chamada conversa de ‘cerca’. Nessa prosa despretensiosa, o interlocutor primeiro ‘cerca’ o outro com temas leves, sondando o terreno, entendendo seus limites, criando um ambiente de confiança e camaradagem. Só depois, quando a conexão está fortalecida e o terreno preparado, é que se introduz o ponto principal, quando necessário. Essa reflexão foi feita pelo comunicador Marcelo Tas, apresentador do Provoca e comentarista do Jornal da Cultura, em entrevista na segunda-feira (29) ao Roda Viva.
O tempo dedicado para uma boa conversa não é visto como perdido, mas como um investimento. No interior do país, esse ritual é mais comum, com vizinhos sentados em cadeiras de balanço nas calçadas, trocando histórias, rindo e refletindo sobre a vida. Não há pressa! Não há urgência. A conversa flui como um rio. Ora calma, ora turbulenta. Mas, sempre seguindo seu curso natural.
Essa arte de ‘cercar’ pode ser vista como uma lição valiosa para a comunicação e o marketing modernos. Em um tempo em que tudo é imediato, muitas vezes, deixa-se em segundo plano a importância de construir uma relação de confiança antes de vender uma ideia ou produto. A pressa em transmitir a mensagem principal pode resultar em uma desconexão com o público-alvo, que não teve tempo de se engajar ou se identificar com o que está sendo proposto.
Antes de tentar vender, é crucial entender o público, suas necessidades, medos e desejos. É preciso ‘cercar’ com conteúdo relevante, que gere interesse e crie um vínculo genuíno. Só então, com o terreno preparado, a mensagem principal encontrará receptividade e ressoará de forma mais eficaz.
“Principalmente, se é um assunto difícil. Não pode chegar já com a machadada na testa. Tem que ter primeiro uma conversa e hoje isso está muito em falta no mercado. Um grupo de WhatsApp não resolve problemas por milagre(…) Talvez você esteja criando mais problemas ao criar um grupo de WhatsApp”, disse Marcelo Tas, destacando também a arte da ‘poda’, no sentido metafórico de ajustar as arestas para buscar algo melhor.
Ao olhar para a simplicidade e sabedoria da conversa de cerca e da técnica da poda, encontramos caminhos para nos conectar verdadeiramente uns com os outros e resistir às pressões que o ritmo da era digital nos impõe. Para além disso, há um norte para mais qualidade na vida real!